O abrandamento da subida de temperatura mundial que se vem
verificando há 10 a 15 anos não põe em causa as projecções de
aquecimento global a longo prazo mas é um quebra-cabeças para os
peritos.
O Grupo Intergovernamental de Peritos para a Evolução
do Clima (GIEC), o órgão científico de referência em matéria de
aquecimento, vai declarar oficialmente nesta sexta-feira em Estocolmo
que a temperatura do globo já aumentou mais de 0,8 graus Celsius desde o
início do século XX e que continuará a subir ao longo do século XXI.
Mas esta constatação mais
do que repetida apresenta uma anomalia há dez a 15 anos: enquanto as
concentrações de dióxido de carbono (CO2), principal responsável pelo
aquecimento, continuam a aumentar, a temperatura da superfície dos
oceanos e dos continentes tende a estabilizar-se.
De facto,
segundo uma versão do resumo do novo relatório do GIEC, o ritmo do
aquecimento desde 1998, que foi um ano particularmente quente, terá
diminuído para 0,05 graus Celsius por década, contra 0,12 graus Celsius
em média desde 1951. O resumo vai ser debatido esta semana entre
cientistas e representantes dos 195 países-membros do GIEC, antes da sua
publicação formal na sexta-feira.
Os cépticos das alterações
climáticas já se apoderaram obviamente deste recente iato no aquecimento
global para questionar os modelos do clima e até contestar o contributo
humano para o aquecimento. Quanto aos climatólogos, lembram que a
tendência ao longo de várias décadas confirma as suas previsões. Para
mais, a última década foi a mais quente de que há registo e os outros
sinais de aquecimento não estão a marcar uma pausa: diminuição das áreas
de gelo, subida do nível do mar, eventos extremos…
Seja como for,
as causas desta estabilização não foram ainda completamente
desvendadas. Será ela devida à influência das partículas vulcânicas, que
reflectem os raios do Sol? Ou a uma diminuição da actividade solar? Os
estudos mais recentes destacam o papel dos oceanos, e a uma maior
absorção do calor em profundidade, e à influência fulcral do recente
arrefecimento do Pacífico equatorial
Uma ou duas vezes por século
O
Serviço Meteorológico britânico (Met Office) reconheceu este Verão que
esta “pausa” levanta “importantes questões sobre o nosso nível de
compreensão e de observação” do sistema climático e dos oceanos.
Contudo, conclui, “isso não invalida os modelos climatológicos”.
“Actualmente, a duração do fenómeno não é incompatível com os modelos”,
confirmou à AFP Laurent Terray, físico do clima do Centro Europeu de
Investigação e de Formação Avançada em Cálculo Científico (Cerfacs).
“Isso pode acontecer uma ou duas vezes por século. Se se prolongar por
duas décadas sucessivas, podíamos começar a perguntar se os modelos não
estarão a subestimar a variabilidade interna do clima” – isto é, a sua
variabilidade natural, acrescenta o investigador.
O problema, para
o GIEC reside no facto que muitos estudos sobre o tema são demasiado
recentes para terem encontrado o seu lugar no longo processo de síntese e
de validação na base do novo relatório destinado a esclarecer os
decisores políticos e económicos.
Em Estocolmo, desde
segunda-feira, as discussões têm incidido em parte sobre a maneira de
evocar esta “pausa”. E a julgar pelos comentários submetidos pelos
governos antes da reunião, a que a AFP teve acesso, as opiniões
divergem. Para a Noruega, o relatório “devia abordar a pausa actual de
forma mais explícita, explicando como o calor foi absorvido pelos
oceanos nos últimos 10 a 15 anos”. A China e os EUA também advogam a
favor de uma maior clareza na explicação da pausa.
Quanto à
Bélgica, deplora a utilização de 1998 como início de um qualquer período
de avaliação estatística, dado aquele ano, marcado pelo fenómeno El
Niño, ter sido excepcionalmente quente.
Mas será que o GIEC pode
manter o silêncio sobre esta questão? “Dada a atenção de que este tema
está a ser alvo, acho que o GIEC precisa de a abordar e de apresentar
claramente os factores para que os decisores percebam”, diz Aklen Meyer,
um dos responsáveis pela estratégia da Union of Concerned Citizens, um
influente grupo de reflexão norte-americano. O GIEC, sob pressão após a
detecção de vários erros no seu último relatório (de 2007),
“tornar-se-ia extremamente vulnerável a novas críticas, sinceras ou não”
se não falasse do tema, diz por seu lado Wendel Trio, director da ONG
Climate Action Network Europe.
Fonte:http://www.publico.pt/ciencia/noticia/pausa-no-aquecimento-esta-a-deixar-os-climatologos-perplexos-1606900
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